Extraído do capítulo 5 de Thinking about Logic de Stephen Read, OUP
Como a linguagem é possível? Como é possível, a partir da aprendizagem
de um vocabulário básico e finito de uma linguagem, formar um sem
número de novos enunciados, novas proposições que expressam
pensamentos que nunca foram antes formulados? Pois isso é possível.
Apesar do vocabulário de uma linguagem ser mundo grande, como uma
olhada no dicionário revela, ele é pequeno quando comparado com o
número imenso de sentenças que compõem os livros das bibliotecas
espalhadas pelo mundo. Dentre essas sentenças, poucas são idênticas.
Dentre as sentenças que lemos, poucas são as que nós vimos antes. Como
é possível que o leitor compreenda essas sentenças? Como é possível
que o leitor as conceba e formule?
A resposta é óbvia, mas suas implicações são poderosas. Nós podemos
aprender uma linguagem porque seu vocabulário e suas regras
gramaticais são relativamente pequenas – ambas podem ser reunidas em
um pequeno número de volumes. Um dicionário de alguns volumes como o
Oxford English Dictionary contém pouco mais que o vocabulário da maior
parte dos falantes individuais do inglês. E mesmo esse dicionário
consiste de dez ou doze volumes, o que é uma pequena parte da
biblioteca onde ele está. A partir desse vocabulário, as regras
gramaticais permitem a criação de um número infinitamente grande de
sentenças. Para que possamos entender tais sentenças, os significados
das palavras individuais são combinados de acordo com a estrutura
estabelecida pela gramática. Em outras palavras, da mesma forma que
uma sentença é literalmente composta pelas palavras que ela contém, o
significado de uma sentença, a proposição, é de alguma maneira
'composto' pelos significados das palavras que ela contém. A idéia
inicial é óbvia: entendemos novas sentenças porque entendemos como
seus significados resultam dos significados das palavras que as
constituem. As implicações disso não são óbvias, e o que isso diz não
é tão claro: os significados das palavras se combinam de algum modo
para compor o significado da sentença completa, a proposição por ela
expressada.
O princípio em questão aqui é por vezes chamado de 'princípio da
composicionalidade', outras vezes de 'princípio de Frege', o grande
filósofo alemão da matemática e da linguagem do fim do século XIX. Os
dois termos cobrem aplicações bastante diferentes da idéia básica. Mas
a motivação subjacente é a mesma. De algum modo precisamos explicar a
'criatividade' da linguagem, o modo pelo qual uma criança, ao ouvir um
número finito e pequeno de enunciados, desenvolve a habilidade de
produzir e compreender um sem número de proposições que não estão
entre os dados sobre os quais tal habilidade foi desenvolvida. A
explicação é a mais simples e a mais plausível para preencher essa
lacuna, e está de acordo com a experiência pessoal, do falante de uma
linguagem, de participar de uma conversa – um conjunto de enunciados
seus e de outros falantes. Os dados iniciais e os novos enunciados
produzidos são analisados em componentes significativos, e é postulada
uma conexão entre o todo e as partes. Mas o que é essa conexão?
Aqueles que chamam essa idéia de princípio de 'composicionalidade'
estarão inclinados a interpretar essa conexão de modo bastante
literal. Eu mencionei no capítulo 1 como Russell considerou que as
proposições – significados das sentenças e objetos de crença – teriam
como constituintes particulares e universais. Assim, por exemplo, a
proposição que Sócrates é sábio teria, literalmente, Sócrates e a
sabedoria como constituintes. Para Russell, o significado de
'Sócrates' era o próprio filósofo Sócrates, em pessoa; e o significado
de 'é sábio' era o universal ou a propriedade sabedoria. Portanto, o
significado da sentença 'Sócrates é sábio' seria composto por Sócrates
e a sabedoria, do mesmo modo que a sentença é composta por sujeito e
predicado. Uma visão mais sofisticada, diferentemente, aponta para uma
dependência funcional do significado da expressão complexa em relação
aos significados das suas partes. Considere uma analogia: 4 é o
resultado do quadrado de dois, 4 = 22, mas 4 não contém literalmente o
número 2 como um constituinte, tampouco contém a função y = x2, que
recebe um número x e o eleva ao quadrado produzindo um número y.
Antes, 4 é o resultado de aplicar ao número 2 a função que eleva um
número ao quadrado. Para Frege, é desse modo que se estabelece a
conexão entre o significado de uma sentença e os significados das suas
partes. O quadro é mais complicado porque Frege distinguia o
significado da expressão dos seus componentes. Mas o princípio é
preservado: o significado de uma expressão complexa, uma sentença por
exemplo, resulta dos significados das suas partes e pode ser calculado
a partir deles. Assim, a compreensão das partes e do modo elo qual o
todo depende das partes explica a compreensão do todo.
* * *
Como a linguagem é possível? Como é possível, a partir da aprendizagem
de um vocabulário básico e finito de uma linguagem, formar um sem
número de novos enunciados, novas proposições que expressam
pensamentos que nunca foram antes formulados? Pois isso é possível.
Apesar do vocabulário de uma linguagem ser mundo grande, como uma
olhada no dicionário revela, ele é pequeno quando comparado com o
número imenso de sentenças que compõem os livros das bibliotecas
espalhadas pelo mundo. Dentre essas sentenças, poucas são idênticas.
Dentre as sentenças que lemos, poucas são as que nós vimos antes. Como
é possível que o leitor compreenda essas sentenças? Como é possível
que o leitor as conceba e formule?
A resposta é óbvia, mas suas implicações são poderosas. Nós podemos
aprender uma linguagem porque seu vocabulário e suas regras
gramaticais são relativamente pequenas – ambas podem ser reunidas em
um pequeno número de volumes. Um dicionário de alguns volumes como o
Oxford English Dictionary contém pouco mais que o vocabulário da maior
parte dos falantes individuais do inglês. E mesmo esse dicionário
consiste de dez ou doze volumes, o que é uma pequena parte da
biblioteca onde ele está. A partir desse vocabulário, as regras
gramaticais permitem a criação de um número infinitamente grande de
sentenças. Para que possamos entender tais sentenças, os significados
das palavras individuais são combinados de acordo com a estrutura
estabelecida pela gramática. Em outras palavras, da mesma forma que
uma sentença é literalmente composta pelas palavras que ela contém, o
significado de uma sentença, a proposição, é de alguma maneira
'composto' pelos significados das palavras que ela contém. A idéia
inicial é óbvia: entendemos novas sentenças porque entendemos como
seus significados resultam dos significados das palavras que as
constituem. As implicações disso não são óbvias, e o que isso diz não
é tão claro: os significados das palavras se combinam de algum modo
para compor o significado da sentença completa, a proposição por ela
expressada.
O princípio em questão aqui é por vezes chamado de 'princípio da
composicionalidade', outras vezes de 'princípio de Frege', o grande
filósofo alemão da matemática e da linguagem do fim do século XIX. Os
dois termos cobrem aplicações bastante diferentes da idéia básica. Mas
a motivação subjacente é a mesma. De algum modo precisamos explicar a
'criatividade' da linguagem, o modo pelo qual uma criança, ao ouvir um
número finito e pequeno de enunciados, desenvolve a habilidade de
produzir e compreender um sem número de proposições que não estão
entre os dados sobre os quais tal habilidade foi desenvolvida. A
explicação é a mais simples e a mais plausível para preencher essa
lacuna, e está de acordo com a experiência pessoal, do falante de uma
linguagem, de participar de uma conversa – um conjunto de enunciados
seus e de outros falantes. Os dados iniciais e os novos enunciados
produzidos são analisados em componentes significativos, e é postulada
uma conexão entre o todo e as partes. Mas o que é essa conexão?
Aqueles que chamam essa idéia de princípio de 'composicionalidade'
estarão inclinados a interpretar essa conexão de modo bastante
literal. Eu mencionei no capítulo 1 como Russell considerou que as
proposições – significados das sentenças e objetos de crença – teriam
como constituintes particulares e universais. Assim, por exemplo, a
proposição que Sócrates é sábio teria, literalmente, Sócrates e a
sabedoria como constituintes. Para Russell, o significado de
'Sócrates' era o próprio filósofo Sócrates, em pessoa; e o significado
de 'é sábio' era o universal ou a propriedade sabedoria. Portanto, o
significado da sentença 'Sócrates é sábio' seria composto por Sócrates
e a sabedoria, do mesmo modo que a sentença é composta por sujeito e
predicado. Uma visão mais sofisticada, diferentemente, aponta para uma
dependência funcional do significado da expressão complexa em relação
aos significados das suas partes. Considere uma analogia: 4 é o
resultado do quadrado de dois, 4 = 22, mas 4 não contém literalmente o
número 2 como um constituinte, tampouco contém a função y = x2, que
recebe um número x e o eleva ao quadrado produzindo um número y.
Antes, 4 é o resultado de aplicar ao número 2 a função que eleva um
número ao quadrado. Para Frege, é desse modo que se estabelece a
conexão entre o significado de uma sentença e os significados das suas
partes. O quadro é mais complicado porque Frege distinguia o
significado da expressão dos seus componentes. Mas o princípio é
preservado: o significado de uma expressão complexa, uma sentença por
exemplo, resulta dos significados das suas partes e pode ser calculado
a partir deles. Assim, a compreensão das partes e do modo elo qual o
todo depende das partes explica a compreensão do todo.
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